Hoje, dia 02/02/2017, fez um ano da minha libertação profissional. Em setembro de 2015, quando eu e minha família decidimos que faríamos algo inusitado (passar 1 ano viajando ao redor do mundo), colocamos as contas na ponta do lápis para saber se seria possível, além de viajar por 1 ano, passar 1 ano sem meu salário fixo até a viagem.
O primeiro passo foi decidir a data da viagem. Pelo ano escolar de nossa filha, optamos que o início da viagem seria em dezembro de 2016. Ela terminaria o ensino fundamental e, por ainda estar um ano adiantada nos estudos, acreditamos que não seria um impacto muito grande perder “um ano escolar”.
Para o segundo passo, colocamos todos os nossos custos em uma planilha e verificamos o que poderia ser cortado dos nossos gastos. O que mais impactava em nosso orçamento era manter um empregado doméstico. Esse talvez tenha sido a parte mais difícil pra gente, já que nos últimos 13 anos, sempre tivemos alguém que morava com a gente para cuidar da casa e fazer companhia para nossa filha. Foi realmente difícil, mas foi super possível e viável já que nós três tínhamos missões das tarefas do lar bem definidas e todos se ajudavam.
O terceiro passo foi conversar com meu chefe. Havia surgido uma oportunidade de realizar dois workshops de fotografia no Rio de Janeiro e outro em São Paulo com dois dos melhores fotógrafos de casamento do brasil e do mundo. Ainda coincidiria com o aniversário da minha esposa (Renata). Mas como nem tudo são flores, esse período que eu gostaria de tirar férias iria coincidir com uma entrega de obra e provavelmente meu chefe não iria me liberar. Mandei uma mensagem de texto pra ele e ele me retornou como imaginei. Disse então que gostaria de conversar pessoalmente com ele o mais rápido possível. É engraçado como a regra do jogo muda quando você deixa de baixar a cabeça e para de aceitar as imposições das companhias.
Quando eu encontrei com o chefe, ele logo falou que já havia pensado e que eu poderia tirar as férias no período que eu estava precisando. Ele não queria nem deixar eu falar, porque ele já sabia o que eu iria pedir. Foi então que em setembro de 2015 eu anunciei ao meu chefe que a partir do dia 01/01/2016 eu não voltaria mais para o interior do estado e que estaria me demitindo.
Ele havia imaginado que eu iria pedir algo parecido, uma vez que eu já havia sinalizado a minha insatisfação de morar longe de São Luís e que seria algo que logo aconteceria. Ele ainda deixou eu passar o mês de janeiro na minha cidade para que eu tentasse uma relocação para dentro da ilha. Realizei uma entrevista nos meados de janeiro e no último dia do mês de janeiro eu recebi uma ligação do RH dizendo que o meu perfil não se encaixava para a vaga disponível. Ali se encerraria meu segundo ciclo nessa empresa. 5 anos e 6 meses.
Engraçado. Minha avó trabalhou por muitos anos nessa empresa no Rio de Janeiro, depois foi a vez da minha mãe também trabalhar por lá. Eu cresci toda a minha infância olhando minha mãe vestindo aquela roupa cor caqui e nunca havia me passado pela cabeça que um dia eu também estaria vestindo esse mesmo uniforme. Três gerações passando pela companhia.
A minha trajetória na companhia se deu pelas circunstâncias da vida. Minha filha nasceu em 2002 quando eu tinha apenas 19 anos. Em maio de 2004 surgiu uma oportunidade para uma vaga na empresa que foi oferecida para filhos e irmãos de funcionários. Tive sucesso no processo e então dei início à minha carreira profissional nessa empresa.
Meu primeiro ciclo na empresa se encerrou em dezembro de 2008. Eu estava me formando em engenharia elétrica quando Renata havia passado para um concurso em João Pessoa. Assim, coincidindo o concurso público, mudança de cidade e com minha graduação, resolvi pedir minha primeira demissão nessa empresa em dezembro de 2008. Mais uma vez, em plena crise financeira que assolava o país. Muitos me chamando de louco mas que admiravam minha coragem.
Um ano e oito meses depois surge pra mim uma ótima oportunidade de voltar para a mesma empresa. Agora como engenheiro e com um curso de pós-graduação em Gerenciamento de Projetos na FDC totalmente pago pela empresa. Dream? Acho que sim. Então, voltamos a morar em São Luís em janeiro de 2010 após a conclusão da pós em Minas Gerais.
Legal, Reis. Mas, e aí? O que você fez quando saiu da empresa pela segunda vez, em fevereiro de 2016, mais uma vez em plena crise financeira no país?
Chorei. Sou chorão mesmo. Era um mundo de certezas quase incertas. Quando eu me vi no primeiro dia, sem ter que levantar “obrigatoriamente” às 5h30 da manhã para me arrumar e pegar meu ônibus, pensei: “Que loucura e agora?”. Estava preparando o café da manhã nesse primeiro dia após meu desligamento e tocando Nando Reis no Spotify. Quando uma música melódica numa versão acústica fez com que eu me emocionasse. Nando Reis “E agora, o que eu vou fazer?”.
Bom. Nos últimos 5 anos havíamos começado a fotografar e estudar fotografia. Investimos em conhecimentos e equipamentos. Onde aparecia alguém querendo COMPARTILHAR INFORMAÇÕES, lá estava eu e Renata querendo escutar o que eles estavam dispostos a ensinar. Com isso, oportunidades e práticas foram surgindo. Começamos a pegar trabalhos de fotografia. Book de família, gestante, crianças, aniversários, ensaio pré-casamento e casamentos.
Passei a trabalhar em casa com a fotografia, planejamento da viagem, poker e trade. Com o poker e trade eu não tive muito sucesso. Ficou mais para um hobby. Mas o planejamento da viagem e a fotografia rendeu trabalho suficiente para que eu não me sentisse “desocupado”. Os dias, horas e semanas passaram rápido. Sinceramente eu não vi o ano passar.
Todo o lucro que a fotografia nos rendeu foi dividido em aquisição de conhecimentos, equipamentos e poupança para a independência financeira e para a viagem.
E como começou tudo isso? Essa vontade de viajar?
Sempre fui apaixonado pela língua inglesa. Apesar de nem sempre ter dedicado muito tempo para estudo. Em 2010, resolvi virar o jogo. Estudava inglês 10 horas por semana no mínimo. Hospedei vários estrangeiros gratuitamente em minha casa só para ter alguém para praticar inglês.
Eles também me inspiravam muito. Sempre me perguntava como que eles ficavam 3, 6, 12 meses viajando. Começamos a estudar como poderíamos trabalhar de forma online ou ter alguma carreira que fosse possível e menos complicado trabalhar de qualquer lugar do mundo. A paixão e dedicação pela fotografia foi uma das formas encontrada.
E a família e amigos?
Meu pai meio que “surtou” quando eu pedi meu desligamento. Ficou super preocupado e perguntando se eu não tinha interesse de trabalhar na empresa X ou abrir uma empresa Y. Só dizia pra ele: “Pai, você sabe que se eu realmente estiver precisando ou passando por alguma necessidade, você sabe que eu vou te escutar. Por enquanto, a fotografia tem dado um bom resultado e é tudo o que preciso para o momento”.
Em maio-2016 decidimos comunicar para a família e amigos. Juntei o máximo deles, liguei para quem estava longe e falei do nosso projeto. Alguns ficaram boquiabertos, maravilhados, outros diziam que era um estilo de vida que não se imagina. No final, muito apoio de todos. Isso é bem gratificante.
Mas e então, valeu a pena ter essa libertação profissional? Você se arrepende do tempo que ficou como empregado?
Não me arrependo em nenhum momento do tempo que fiquei na empresa. Foram momentos de muitos aprendizados, reconhecimentos, conquistas profissionais e financeiras. Mas acredito que o a chave virou, que o sonho e planos mudaram.
Infelizmente, somos instruídos através das gerações a estudar, se formar, ser empregado, comprar um carro, casar, comprar uma casa e ter filhos. Depois, ver o ciclo se repetindo. Às vezes com algumas poucas alterações das ordens.
Realmente, nunca imaginei como seria viável passar 1 ano viajando. Mas a liberdade profissional que estamos vivendo no momento está sendo ESPETACULAR.
Nunca digo nunca. Pode ser que um dia eu volte a trabalhar em uma empresa, cumprindo horários e metas organizacionais. Mas para o momento, tudo o que eu quero é continuar curtindo esse momento, administrar bem o que conquistamos e poder compartilhar e ajudar o máximo de pessoas dispostas a fazer o mesmo.
Existe sim um caminho fora das grandes organizações. Não é fácil. Mas é possível.
8 respostas
Parabéns e boa sorte, Reis! Espero que retorne à Vale ao fim dessa jornada! O enriquecimento pessoal também torna a pessoa mais interessante profissionalmente, não tenha dúvidas!
Abraço!
Valeu, Gabriel. Vamos ver se em alguns anos eu apareço por lá de novo. Rsrs. Abraço!
Adorei ler o texto Reis! Incrível como eu sempre aprendo ainda mais da história de vocês – e os admiro ainda mais.
Muita felicidade e sucesso nessa jornada!
Obrigado, Mina.
Todos temos algumas histórias para contar. Mas tem cada história que a gente escutou já aqui na viagem que essas aqui são fichinhas. Rsrs
Massa reis,Lembro de ti quando cheguei na vale batendo aquela chave(só quem trabalha nisso sabe essa gíria)sucesso nessa empreitada!!!!
Hahahaha… Isso mesmo, meu amigo. Velhos tempos. Bons aprendizados. Crescer e evoluir. Sempre! Abraço.
Gostei demais do relato, acompanhei muitos desses passos e sei o quanto se esforçaram pra conseguir realizar esse projeto. =*
Maravilha, Reis!!! Adorei o relato e da forma como o escreveste! Acredito que uma decisão como essa requer muita coragem, determinação, e principalmente um cuidadoso planejamento. Sucesso!!!